Disseram-me que usava óculos, é tudo que sei. Mais nada. Ela
deixou-me aqui na porta eu era um bebê embrulhado em panos nem registro de
nascimento eu tinha.
Há dezessete anos fui recolhida pelas freiras e assim ficou
minha data de aniversário, não é exatamente esta, que parecia que eu tinha uns
dez dias de idade, disseram-me elas.
Ninguém quis ficar comigo, não conseguiram minha adoção.
Ninguém quer crianças negras. Na verdade, aqui na Casa existem poucas crianças
brancas, elas conseguem sair, mesmo as feinhas e sem graças. Difícil é com as
meninas negras de cabelo pixaim e duros que não temos shampoo nem qualquer
outro luxo. Somos pobres. Temos de economizar por que a cada dia chegam mais
meninas.
O que eu quero de presente, perguntou-me a mocinha que eu
apadrinhava naquele Natal.
Ah! Queria ganhar uma roupa bonita, creme para os cabelos e
um brinco, mas não tenho orelhas furadas. É outro luxo para as crianças da
Casa.
Não posso dizer que sou infeliz aqui, disse-me ela com muita
delicadeza. As freiras são bravas, mas ao mesmo tempo são pacientes por que
aqui as crianças têm muitas dificuldades.
Nós maiores ajudamos em tudo, é nossa obrigação e
aprendizagem dizem as freiras, por que aos dezoito anos vamos sair para
enfrentar o mundo.
Falta pouco para eu sair e tenho medo. Ao mesmo tempo, junto
com ele tenho a esperança de que lá fora vou encontrar minha mãe, ela vai me
abraçar e beijar como nunca fui amada. Vou prestar atenção em cada mulher negra
que usa óculos, vou olhar seu rosto, estudar se parece comigo e vou perguntar:
-A senhora deixou um bebê na porta da Casa Nossa Senhora
Menina? Sou eu. Meu nome é Aurora e sempre tive esperanças de olhar seu rosto e
sorrir de felicidades. Eu quero dormir no seu peito, sentir seu cheiro de mãe,
ouvir sua voz contando histórias para me fazer dormir. Quero ser sua filha
mesmo que seja tão tarde.
Solange Vicentino T. Mossenbock
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