segunda-feira, 12 de março de 2018

Outono - Por José Carlos Munhoz Navarro



Outono
Por José Carlos Munhoz Navarro

Sangra a terra, firme e reto o arado
Na modernidade das máquinas ou no velho e lento processo
(não é importante o meio)
Prepara a terra para a semente milagrosa, que se transforma em verde infinito, que vira sustento dos famintos, ou de mesas abastadas.
(não é importante o destino)
Mas, risca a terra, firme e sempre o arado, revolvendo tudo, criando sulcos

Marca o rosto, implacável e sempre o tempo
No turbilhão incessante dos dias, ou na quietude e suavidade noturna
(não há distinção de tempo ou espaço)
Molda e tempera o homem para a semente poderosa que se transforma em palavras infinitas que viram abrigo de tantos abandonados ou dos poucos evoluídos
(só é importante que abriga)
Risca o rosto, firme e sempre o tempo, revigorando o homem, criando vidas

É outono nas árvores que oferecem seus frutos àqueles que deles usufruem, seja colhendo suave ou arrancando com ímpeto, tanto para aqueles que entendem o fruto como resultante inútil ou àqueles que o sabem, um alimento e uma vida.

É outono nas árvores que sempre e sempre renovarão seus frutos e os espalharão à sua volta como tributo à boa e incansável terá mesmo quando, todos se tornarem saciados ou insensíveis e não os quiserem mais

É outono nos dias daqueles que multiplicam seus conhecimentos; àqueles que convivem de forma elevada ou com instinto animal; àqueles que desdenham o sabor da vida ou naqueles que já reconhecem nela a passagem ao plano espiritual maior

É outono dos homens que sempre recitarão suas preces com respeito à propriedade e infinita vida e as multiplicarão à sua maneira, nas paredes, nos templos, nas consciências, no vento, nos bares, nas praças, nas mesas, nas casas, mesmo quando todos se tornarem surdos e não puderem, ou não quiserem ouvir mais

Viver o outono é sorrir toda manhã ao notar uma nova marca no seu rosto;
É saber que precisamos abençoar tanto a mão que pede como a que agride;
(e com certeza possamos até entender mais esta do que aquela)
É saber que poderemos nos fazer entender por todos, seja o perfeito ou o surdo;
É saber que o corpo humano se torna mais frágil, mais lento, mais pesado
É saber, no entanto, que a alma que nos conduz está e é cada vez mais forte, ágil e leve, pois estamos dentro deste outono de vida, no verdadeiro relógio da existência no limiar da fertilidade.

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