sexta-feira, 30 de junho de 2017

ANA POLESSI - O CAIPIRA E AS MODERNIDADES

                                                                             
João do Burro estava encostado na porta do restaurante da Dona Zefa. Ele era o João do Burro, mas tinha mesmo uma carroça puxada por um cavalo velhinho. Fazia uns bicos para ganhar uns trocados, quando a roça estava produzindo pouco.
Fazia uns minutos que ele acompanhava com os olhos e ouvidos o drama da Zefa tentando atender um casalzinho de paulistanos estressados que haviam parado por aquelas bandas para almoçar.
- Essa comida sai ou não sai? Faz dez minutos que fizemos o pedido!
- É o fogão à lenha, Matias, demora séculos! Eu te disse para seguirmos direto até o primeiro fast food que encontrássemos!
 - Esta espelunca não tem tomada para  plugar meu laptop! Tenta pedir um uber pelo celular!
- Não tem sinal! Não pega nada neste interior!
- Só pega moda de viola nessa rádio que a cidadã ligou aí! O, minha filha, essa comida sai ou não sai?
- E esse caipira aí, na porta, olhando direto para nós? Tá pensando o quê, ô capiau? Tira uma foto da gente prá guardar!
Daí o João entrou no restaurante, com a carinha humilde, com o chapéu na mão .
- Me adiscurpe, moço. Eu nem ia falá, mas tou vendo que vocês tão todo apressado ...o seu carro tá com dois pneu furado...
- Quê?
Eles correram para a porta e viram o ocorrido.
- E agora? Sem celular, sem laptop...Não tem telefone perto? Tem telefone aqui no restaurante?
- Não, num tem não. Todo mundo mora perto, mas num precisa de telefone.
- Ô, caipira, você não leva a gente numa borracharia?
O João botou o chapéu na cabeça fingindo tristeza.
- Discurpa, dotô, mas num vai dá não...
- Por que não?
- Meu cavalo tá carregando a bateria...
O cavalinho estava fazendo uma refeição ali perto, comendo mato  no jardim.


-E agorinha mesmo eu vou aí no banheiro da Zefa fazê um daunloudi...

Obs.: Dedicado a dois paulistanos estressados que conheci numa viagem há muito tempo...

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