Disse-nos Bilac que é a Última flor do
Lácio, inculta e bela. Casemiro de Abreu trouxe-nos a saudade aurora da sua (e
nossa) vida, Gonçalves Dias nos lembra das palmeiras onde cantam os sabiás. Já
João Cabral nos falou do nordestino, da parte que lhe cabia naquele latifúndio.
Duque Estrada levou-nos ao gigante pela própria natureza, mas lamentamo-nos
também por cantar o deitado eternamente em berço esplendido.
Para não nos estendermos muito,
paremos com Machado de Assis, que chorou em versos suas visitas à última morada
da sua Carolina e ofereceu, com esmero e arte, as batatas aos vencedores. Todos
eles e os que mais recentemente por aqui passaram: Clarice, Vinicius, Amado,
Bonfim cantam e encantam com o uso da nossa bonita - e as vezes tão maltratada
- língua portuguesa, nossa língua nacional, oficial, real.
É certo que veio importada trazida
pelos descobridores e colonizadores portugueses; é certo que tomou lugar do
velho e hoje quase desaparecido tupi-guarani, mas é de fato nossa língua
nacional.
Palavras transmutaram, perderam o
significado, viraram pó, outras surgiram. Novos vocábulos confundiram ideias,
modificaram o sentido, mas aqui a temos.
Invasores surgem, estrangeirismos que se imiscuem em sua grandeza. Por
vezes, também, absorve e incorpora elegantemente os abajures, os cachecóis e
continua a se mostrar, como as distintas e elegantes senhoras, sua classe e
dignidade.
Língua Pátria, com sua norma culta,
com seu linguajar coloquial, com seus dialetos regionais, com seus modismos
sociais. O falar rebuscado e a conversa irritante; o correr singelo das ideias
e a inverdade galopante; a segunda pessoa do singular usada pelo intelectual, o
verbo descompassado do pronome, jorrado pelo menos instruído.
Caminho das longas e instrutivas
conversas, onde os pais, os mestres transmitiam e transmitem aos filhos, aos
alunos o bom, o correto, o que se deve fazer e o que não se deveria fazer. Abro
um parêntesis para prestar minha homenagem ao meu pai por me ensinar a juntar o
B e o A e que me fez chegar onde cheguei.
Caminho das notícias que correm o
mundo, falando de virtudes e desvarios; de ganhos e de perdas; de passado e de
futuro, que nos chegam a todo instante, guiando nossos dias, modificando nosso
cotidiano.
Dos enganos e desenganos a que todos
estamos sujeitos; dos amores e desamores a que todos estamos passíveis.
Desafortunadamente, porém, muito temos
a lamentar nos dias de hoje. Perdeu-se o rumo da boa leitura e, por extensão,
da boa escrita. O atual e acelerado cotidiano inibiu o uso de palavras na sua
plenitude; perdeu-se o espaço da linguagem escrita, perdeu-se muito, queira
Deus que não percamos a identidade de que nossa língua portuguesa é portadora.
É nossa missão fazermos a nossa parte.
E, para encerrar, obrigatório se
torna, recorrer a Olavo Bilac.
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos
vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
em que da voz materna ouvi: "meu
filho!",
E em que Camões chorou, no exílio
amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem
brilho!
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